No início de setembro tivemos no litoral norte paulista uma floração de microalgas, ou como foi chamada, uma maré vermelha. No mesmo período, houve uma floração menos intensa de diatomáceas no litoral sul e centro de São Paulo.
As microalgas são um dos componentes do plâncton, que é a comunidade de organismos que não consegue nadar contra as correntes, sendo na sua maioria microscópicos mas podem chegar a alguns centímetros. As microalgas fazem parte da parcela do plâncton chamada de fitoplâncton, que são os seres do plâncton que realizam fotossíntese, assim como as plantas terrestres. Porém as microalgas não são vegetais, são em geral protistas e bactérias, podem ser unicelulares ou formar colônias. Eles são a principal base da cadeia alimentar marinha.
As florações ocorrem quando as microalgas se proliferam e atingem grandes densidades, podendo alterar a cor da água. A cor das manchas depende das características das microalgas: de seu envoltório celular ou dos pigmentos fotossintetizantes que possuem, já que os pigmentos também variam entre as espécies. Numa floração pode haver de mil a centenas de milhares de organismos por mililitro (ml) de água do mar.
Fatores como temperatura, nutrientes disponíveis, iluminação e até mesmo poluição podem contribuir para o desequilíbrio que leva uma ou algumas espécies de microalgas se reproduzem muito rapidamente causando as florações.
No momento, o Instituto Oceanográfico da USP (IOUSP), o Centro de Biologia Marinha da USP (CEBIMAR/USP) e a Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (CETESB) estão trabalhando em conjunto para entender melhor os motivos que levaram à floração do litoral norte ocorrida no início de setembro. Como são diversos os fatores para que ocorra uma floração, cientistas precisam identificar o organismo e analisar todas as variáveis disponíveis para entender sua causa.
As florações são eventos pouco frequentes na costa paulista litoral norte e ainda há pouco investimento para o monitoramento delas. Dessa forma sempre que elas ocorrem os pesquisadores precisam se mobilizar para realizar as coletas, muitas vezes em alto mar, ou aguardar a aproximação da mancha à costa. As coletas e as análises muitas vezes precisam ser feitas com rapidez, porém sem equipamentos e embarcações disponíveis muitos dos dados são perdidos pela dificuldade de se realizar as coletas.
Até o momento os dados indicam a possibilidade da influência de uma massa d’água, a Água Central do Atlântico Sul (ACAS),que ficou mais próxima da superfície na costeira, fenômeno chamado de ressurgência costeira. Se for esse o caso, essa massa d’água é muito rica em nutrientes, então existe a possibilidade de a grande disponibilidade de nutrientes ter disparado o crescimento acelerado da população de microorganismos do fitoplâncton.
Sabe-se também que a microalga que causou a mancha pertence ao grupo dos dinoflagelados (veja abaixo o vídeo do CEBIMar/USP da amostra coletada), porém para se chegar à espécie os pesquisadores estão fazendo a identificação por DNA e por microscopia eletrônica de varredura. Em geral, no litoral norte paulista existem vários registros informais de florações de Trichodesmium spp., uma cianobactéria.
Essas florações geram muitos impactos negativos. Com o rápido crescimento das algas, elas acabam por consumir muito mais oxigênio dissolvido no mar, assim fica menos oxigênio disponível para outros organismos, como os peixes. Algumas microalgas também possuem toxinas, que na concentração comum não geram problemas, mas em grandes quantidades podem prejudicar ou até matar outros organismos. É recomendado que banhistas não entrem na água com florações pois as toxinas podem irritar a pele e causar lesões e, principalmente, essa água não deve ser ingerida pelo risco de intoxicação. Caso a floração seja tóxica, não devem ser consumidos mexilhões, peixes e outros organismos marinhos coletados ou cultivados na região e proximidades das florações, a intoxicação pode ser aguda e em alguns casos pode até causar a morte de quem consumiu os pescados contaminados.
No panorama mundial, estamos tendo um aumento nos casos de florações de microalgas, pois com o despejo de esgoto doméstico e o excesso de fertilizantes da agricultura que chegam aos rios que desaguam no mar ocorre o aumento de nutrientes, que é um dos fatores que podem gerar uma floração de microalgas. Em todas as áreas onde se desenvolvem atividades de aquicultura diretamente no mar o monitoramento da qualidade da água é uma questão de saúde pública. Os órgãos responsáveis por este monitoramento têm um grande desafio em detectar as florações que sejam tóxicas para tomar as medidas cabíveis para preservar a população. Estes mecanismos existem no Brasil porém ainda precisam ser melhorados, com maiores investimentos para os grupos de pesquisa e de monitoramento.